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letra de ao azar balthazar - vitor brauer

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todo dia a gente acorda, come, caga, banha, bebe e trabalha
todo dia a gente acorda, escova os dentes, passa desodorante e às vezes a navalha
parece próxima, parece tão próxima que parece ser mais fácil desistir
do consumir de toda essa batalha
de desistir de todo essa desgraça

quantas milhões de vezes a gente já se viu nesse mesmo еspelho
narizes tortos, bocas tortas, dentе precisando de aparelho
até os olhos sucumbem ao sangue que já invade a íris sempre vermelho
do consumir de toda essa batalha
de viver sempre à caça

como sair desse lugar que todo dia é correr contra o tempo
de acordar de noite pensando jesus vai ser assim todo momento
todo dia consciente que o tempo tá passando sem consentimento
todo dia ela faz tudo sempre igual
todo dia ela faz tudo sempre igual
do consumir de toda essa batalha
do suspirar dessa cachaça

agarrando pelos cabelos
os momentos que são bons
a felicidade
é tão passageira que a gente

pensa que todo dia que a gente vai trabalhar
a gente tá trabalhando pra construir
a gente tá investindo na gente mesmo
a gente tá sonhando com alguma coisa
a gente tá consumindo a gente mesmo pra construir
o que mesmo que eu nem lembro mais
um dia qualquer já pode ser demais
e a gente se multiplica feito coelhos
transando, trepando, fingindo que tá fazendo amor
sempre multiplicando o que tem de pior na gente mesmo
sempre fazendo, nos forçando, forçando os outros
invadindo o que não é nosso, destruindo o que não é nosso
destruindo a gente mesmo
por que eu nem me lembro mais
um dia qualquer já pode ser demais

todo dia a gente acorda e descobre o que não pode mais fazer
criando máscaras e não sendo a gente mesmo
sempre fazendo, nos forçando a ser o que não somos
enganando o cérebro que já tá pra lá de desgastado
pra não invadir o que é do outro, pra não destruir o que é do outro
destruindo a gente mesmo
por que eu nem me lembro mais
um dia qualquer já pode ser demais

agarrando com todas as proteínas
os resquícios de uma vida
que já não existe mais
porque quando a gente acorda, quando a gente acorda

sai com os amigos e se agarra até a última polegada de compreensão
de empatia, de saber que talvez a gente não tá tão sozinho assim
mas na hora que o cara precisa duma ajuda some todo mundo e só aparece uns filho da puta que tão querendo se aproveitar
do que exatamente
de qualquer coisa que seja um resquício
feito burros com nossas viseiras
inteligentes demais pro nosso bem
burros demais pro nosso bem
carregando trouxa de roupas, carregando malas pra lá e pra cá, carregando equipamento, carregando móvel, carregando livro, carregando compra
carregando carga feito animais de carga
será que a vida é só isso?
será que essa vida toda vai ser só isso?

mais uma história de melancolia escura que eu preciso consumir
pra me legitimizar, pra me confortar
e me lembrar que nada do que eu penso é tão maluco assim
que a gente vive numa realidade sem sentido e violenta
com uma mente e um corpo que conspiram contra nós o tempo todo
o que que a gente pode fazer?
me diz o que que a gente vai fazer?
me agarro no último suspiro
todo dia ela faz tudo sempre igual
e se agarra no último suspiro
da memória do que ela foi

num tempo de alegria
que agora já passou
quando chove aqui
você olha e o tempo já mudou
agora, já passou
já passou
já passou
já passou

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