letra de de quarentena - subtil
[verso]
ia ser hipócrita se dissesse
que tinha crescido sem nada
mas quem nada não se afoga
e eu deixei a pólvora enterrada
em terra firme
antes de travar uma guerra com o destino
eu fiz das tripas coração
e da força de vontade um hino
sem bilha de gás
maior maravilha do mundo nem reflexo faz
o que é que o tempo trás
senão forem os meus sonhos
do que vale correr atrás
e eu sei que senão for hoje
amanhã é tarde de mais
no flop tenho dois pares, conheço quem tenha duas caras
leais são os animais, reais como as minhas duas patas
onde eu carrego o peso do meu corpo
sem terços no meu corpo
há quem viva de interesses ou à base de pertences do outro
nenhum dos meus antigos amigos é meu inimigo
no máximo são só pessoas a quem já não ligo
o beat fica em loop a tarde toda parece que desligo
de tudo e todos enquanto converso comigo
ano novo vida nova mais um ano à prova
um novo ano, uma nova vida a mesma cova
farto de levar sempre a mesma sova, o mesmo não
a mesma porta trancada, o carro que só pega de empurrão
quando pega
levei metade do ano a ir de boleia
p’ro trabalho com um colega
todos a quererem-me ver na merda
e eu ainda a sonhar que o rap
mais dia menos dia me emprega
minha alma não se entrega isso é certo
certo como a batida do karma, ser puro rap
mas que rap puro é esse, mas que futuro é esse
que tenta apagar a história como se ninguém a conhecesse
ontem um puto com 13 anos
perguntou-me o que era preciso p’ra ingressar no rap (alma)
eu com um sorriso respondi-lhe que em 2004
o facto mais importante era chegar aos 17
fazer os 18, aos 15 larguei a escola
a rua acolhe-te, só não vale é pedir esmola
e na altura eu já escrevia, ritmo e poesia tudo o que eu queria
era fazer rap sem nunca ter visto um dólar
mas eu via euros a mais, havia mais
nas mão dos putos do que na carteira dos pais
por isso tu vais onde todos te levam
carregas o que todos carregam
até conheceres os tribunais
código penal, do som das sirenes fiz o instrumental
enchi cadernos, mas não há capitólio sem capital
não há um, tu quereres ser tu próprio sem ser igual
ao que todos são
e isso é a princ-p-l motivação p’ra eu ser real
quanto mais o conheço menos vou idolatrá-lo
quanto mais me conheço mais me sinto animal
quanto mais eu penso, mais eu fico perto de saber a verdade
entre o que está certo e o que eu fiz de mal
preciso dum intervalo
este foi o último beat do karma em 2019
e eu vou matá-lo
é no estalo e nostálgico
como uma pedra no gargalo
e eu lá p’rás 3 e tal cheguei, entrei pelo quintal saltei
ao sentir efeitos secundários das drogas que tomei
não me sinto bem hoje ainda não vejo quem
quem é que andou comigo na escola
e bazou da casa da mãe
vai e vem, mais de cem voltas
onde eu já ganhei muitas batalhas sem tropas
a vida é um jogo, baralhas as cartas e apostas
queres ouro mas sem espadas
não cortas os paus p’ra chegar às copas
nem tudo aquilo que parece é
como aparenta ser
e nem tudo aparenta ser aquilo que é
é tipo uma conversa sobre a religião
em que todos os presentes metem em questão a fé
zé dá-me um copo de vinho e o corpo de deus
quem vivia na mexa hoje não mexe com nada
e eu eu vou matar a fome e a sede aos meus
a fome e a sede aos teus
por todas as noites em que eu acordei de madrugada
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